Pesquisadores participantes da colaboração Pierre Auger descobriram que, acima de um determinado nível de energia, estas partículas, que são as mais energéticas da natureza e atingem constantemente a atmosfera terrestre, têm origem extragaláctica.
© Pierre Auger (cascatas de partículas geradas por raios cósmicos)
A colaboração Pierre Auger, o maior observatório do mundo dedicado ao estudo e à detecção de raios cósmicos, está localizado na província de Mendoza, na Argentina. O observatório possui esta denominação em homenagem ao físico francês Pierre Auger (1899-1992).
“A chance de essa conclusão ser fruto do acaso é de dois em 100 milhões,” disse Carola Dobrigkeit Chinellato, professora do Instituto de Física Gleb Wataghin da Universidade Estadual de Campinas (IFGW-Unicamp) e presidente da comissão brasileira no Observatório Pierre Auger.
A partir de dados registrados pelo Observatório entre janeiro de 2004 e agosto de 2016, os pesquisadores observaram que raios cósmicos ultraenergéticos, acima de 8 x 1018 eV (elétrons-volts) chegam em maior número à Terra vindos de um lado do céu.
Esta região no céu de onde vêm mais raios cósmicos ultraenergéticos coincide com a localização de grande parte das galáxias vizinhas da Via Láctea, em um raio de até 700 mil anos-luz.
Esta é uma forte evidência de que os raios cósmicos de altas energias vêm de fora da Via Láctea.
De acordo com os pesquisadores participantes da colaboração, a descoberta contribui não apenas para entender a origem destas partículas ultraenergéticas, como também os mecanismos cósmicos capazes de imprimir tamanha energia a estas diminutas entidades subatômicas, que podem viajar a distâncias de trilhões de quilômetros (anos-luz) através do espaço e chegar à Terra carregando energias extremas.
Núcleos atômicos leves como o do hidrogênio ou pesados como o do ferro, os raios cósmicos chegam à Terra vindos do espaço, a todo instante.
O fluxo destas partículas subatômicas para a Terra, contudo, diminui abruptamente conforme a energia aumenta. As de energia acima de 1018 eV, denominadas ultraenergéticas, como a que os pesquisadores detectaram agora, aparecem na Terra com uma frequência de 1 partícula por quilômetro quadrado (km²) por ano.
Por este motivo, a origem e os mecanismos cósmicos de produção destes raios cósmicos ultraenergéticos, conhecidos há mais de 50 anos, continuam sendo um mistério.
A fim de identificar indícios da origem destas partículas subatômicas de mais alta energia, os pesquisadores membros da colaboração Pierre Auger têm estudado a distribuição de suas direções de chegada à Terra.
Ao atingirem a atmosfera terrestre, a cerca de 10 km a 20 km de altitude, os raios cósmicos ultraenergéticos colidem com núcleos atômicos do ar, como de nitrogênio e oxigênio.
Estas colisões geram centenas ou milhares de outras partículas que seguem rumo ao solo, quase à velocidade da luz (de cerca de 300 mil km por segundo), na forma de cascatas de partículas, chamadas de “chuveiro atmosférico extenso”.
As partículas carregadas no chuveiro excitam as moléculas de nitrogênio no ar, produzindo uma tênue luz azul, que é captada por telescópios de fluorescência do Observatório Pierre Auger durante noites claras.
As partículas também são registradas por 1.660 detectores de superfície do observatório. Espalhados por uma área de 3 mil km2, em uma região plana ao lado dos Andes, os detectores, que operam ininterruptamente, consistem em tanques de polietileno, preenchidos com 12 mil litros de água ultrapurificada e instrumentalizados com sensores fotomultiplicadores.
Quando as partículas de um chuveiro atmosférico atravessam a água no interior do tanque é emitida luz, chamada radiação Cherenkov, que pode ser medida nos sensores.
Com base na análise destes dois tipos de luz, entre outros dados, é possível extrair diversas informações sobre o raio cósmico (dito primário) que iniciou a cascata de partículas no alto da atmosfera.
Fonte: Science