sábado, 20 de agosto de 2022

O próton contém um quark charm?

A descrição num livro didático sobre um próton diz que ele contém três partículas menores, dois quarks up e um quark down, mas uma nova análise encontrou fortes evidências de que ele também contém um quark charm.

© CERN (ilustração de um próton)

O próton, uma partícula encontrada no coração de cada átomo, parece ter uma estrutura mais complicada do que a tradicionalmente apresentada nos livros didáticos. A descoberta pode ter ramificações para experimentos de física de partículas sensíveis, como o Grande Colisor de Hádrons (LHC). 

Enquanto os prótons já foram considerados indivisíveis, experimentos com aceleradores de partículas na década de 1960 revelaram que eles continham três partículas menores, chamadas quarks. Os quarks possuem seis tipos, ou sabores: up, down, top, bottom, charm e strange. Eles geralmente se combinam em grupos de dois e três para formar hádrons, como os prótons e nêutrons que compõem os núcleos atômicos. Uma partícula subatômica composta por um quark e um antiquark de carga de cor oposta formam os mésons. Mais raramente, no entanto, eles também podem se combinar em partículas de quatro (tetraquarks) e cinco quarks (pentaquarks). Estes hádrons exóticos foram previstos por teóricos ao mesmo tempo que os hádrons convencionais, cerca de seis décadas atrás, mas apenas recentemente, nos últimos 20 anos, eles foram observados pelo LHCb e outros experimentos.

A colaboração internacional do LHCb observou, no mês passado, três partículas em decaimentos de mésons B nunca antes vistas: um novo tipo de pentaquark e o primeiro par de tetraquarks, que inclui um novo tipo de tetraquark. As descobertas, apresentadas num seminário do European Organization for Nuclear Research (CERN), adicionam três novos membros exóticos à crescente lista de novos hádrons encontrados no LHC. Eles ajudarão os físicos a entender melhor como os quarks se unem nestas partículas compostas.

Na mecânica quântica, a estrutura de uma partícula é governada por probabilidades, o que significa que teoricamente há uma chance de que outros quarks possam surgir dentro do próton na forma de pares matéria-antimatéria. Um experimento da European Muon Collaboration no CERN em 1980 sugeriu que o próton poderia conter um quark charm e seu equivalente de antimatéria, um anticharm, mas os resultados foram inconclusivos e muito debatidos. Houve outras tentativas de identificar o componente de charme do próton, mas diferentes grupos encontraram resultados conflitantes e tiveram dificuldade em separar os blocos de construção intrínsecos de um próton do ambiente de alta energia dos aceleradores de partículas, onde todo tipo de quark é criado e destruído em rápida sucessão.

Agora, Juan Rojo, da Vrije University Amsterdam, na Holanda, e seus colegas encontraram evidências de que uma pequena parte do momento do próton, cerca de 0,5%, vem do quark charm.

Para isolar o componente do quark charm, Rojo e sua equipe usaram um modelo de aprendizado de máquina para criar estruturas hipotéticas de prótons consistindo em todos os diferentes tipos de quarks e depois as compararam com mais de 500.000 colisões do mundo real de décadas de experimentos com aceleradores de partículas, incluindo no LHC. 

Os pesquisadores descobriram que, se o próton não contiver um par de quarks charm-anticharm, há apenas 0,3% de chance de ver os resultados que examinaram. Este resultado significa 3-sigma, que normalmente é visto como um sinal potencial de algo interessante. Mais trabalho é necessário para aumentar os resultados para o nível de 5-sigma, o que significa cerca de 1 em 3,5 milhões de chance de um resultado por acaso, que é tradicionalmente o limite para uma descoberta.

A equipe analisou os resultados recentes do experimento LHCb Z-boson e modelou a distribuição estatística do momento do próton com e sem um quark charm. Eles descobriram que o modelo combinava melhor com os resultados se o próton fosse assumido como tendo um quark charm. Isso significa que eles estão mais confiantes em propor a presença de um quark charm do que o nível sigma por si só sugere. 

Dada a onipresença desta partícula e há quanto tempo a conhecemos, ainda há muito que não entendemos sobre sua subestrutura. O observatório de neutrinos IceCube na Antártida, que procura neutrinos raros produzidos quando raios cósmicos atingem partículas na atmosfera da Terra, também pode precisar levar em conta esta nova estrutura. A probabilidade de um raio cósmico impactar um núcleo atmosférico e produzir neutrinos é bastante sensível a presença de um quark charm do próton.

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: New Scientist