Cientistas veem fortes indícios da existência de uma partícula inédita, o bóson de Higgs, única partícula prevista pela teoria vigente da física que ainda não tinha sido detectada em laboratórios, e que vinha sendo perseguida ao longo das últimas décadas.
© AFP (representação gráfica de colisão de prótons realizada no LHC)
Pela teoria, o bóson de Higgs teria dado origem à massa de todas as outras partículas. Se sua existência for confirmada, portanto, é um passo importante da ciência na compreensão da origem do Universo. Se ele não existisse, a teoria vigente deixaria de fazer sentido, e seria preciso elaborar novos modelos para substituí-la.
Apesar do grande impacto na física teórica, a descoberta ainda não representa um avanço direcionado a nenhum campo específico da tecnologia.
O bóson de Higgs ganhou o apelido de “partícula de Deus” em 1993, depois que o físico Leon Lederman, ganhador do Nobel de 1988, publicou o livro “The God Particle” (literalmente “a partícula de Deus”, em inglês), voltado a explicar toda a teoria em volta do bóson de Higgs para o público leigo. Ainda não há edição desse livro em português.
A nova partícula tem características consistentes com o bóson de Higgs, mas os físicos ainda não afirmam com certeza sua existência. Para isso, eles vão coletar novos dados para observar se a partícula se comporta com as características esperadas do bóson de Higgs.
O anúncio foi feito em Genebra, na Suíça, sede do Centro Europeu de Pesquisas Nucleares (CERN). As conclusões foram baseadas em dados obtidos no Grande Colisor de Hádrons (LHC), acelerador de partículas construído pelo CERN ao longo de 27 quilômetros debaixo da terra, na fronteira entre a França e a Suíça.
Essa máquina, considerada a mais poderosa do mundo, foi construída especificamente para estudos de física de partículas, e a descoberta desta quarta é a mais importante que já foi feita lá até o momento.
A descoberta foi confirmada por especialistas do CMS e do Atlas, dois grupos de pesquisa independentes que fazem uso do LHC. Apesar de usarem o mesmo acelerador de partículas, as duas colaborações científicas trabalham com detectores diferentes e seus resultados são paralelos. Os resultados antecipados ainda serão publicados em revistas científicas.
Os cientistas medem a massa das partículas como se fosse energia. Isso porque toda massa tem uma equivalência em energia. Se você calcula uma, tem o valor das duas. A unidade de medida usada é o gigaelétron-volt, ou "GeV".
O CMS observou um novo bóson com a massa de 125,3 GeV (entre 124,7 e 125,9 GeV) com margem de erro de 0,6 GeV para mais ou para menos com 4,9 sigmas de significância. Este valor representa uma chance menor que um em 1 milhão de que os resultados sejam mera coincidência. Por isso, os cientistas consideram esse número como uma confirmação da descoberta.
Paralelamente, o grupo Atlas afirmou que exclui a inexistência de uma partícula com a massa de 126,5 GeV, com a probabilidade de 5 sigmas. A pequena diferença entre os números dos dois grupos não é considerada tão significativa pelos físicos.
Em 2011, pesquisadores dos dois grupos de pesquisa do CERN já haviam idenficado a presença de um bóson, cuja a massa estaria entre 115 GeV e 130 GeV.
Na última segunda, pesquisadores norte-americanos também tinham encontrado evidência relevante da existência da partícula, em experiências com um acelerador Tevatron.
Um dos motivos pelos quais é tão difícil detectar o bóson de Higgs é a sua instabilidade. Essa partícula dura muito pouco tempo e rapidamente decai em outras.
Tanto o CMS quanto Atlas concentraram seus esforços em duas partículas específicas: os fótons, que é como a luz se manifesta, e os bósons Z, que medeiam a chamada força fraca. O resultado foi suficiente para identificar a existência de uma partícula inédita, mas não para caracterizá-la em detalhes.
Para confirmar se o bóson descoberto é mesmo o bóson de Higgs será necessário estudar a fundo os decaimentos. O Modelo Padrão – conjunto de teorias mais aceito para explicar as interações da natureza e as partículas fundamentais que constituem a matéria – prevê o decaimento do bóson de Higgs em diferentes partículas, cada uma em determinada quantidade.
O próximo passo dos cientistas é testar os vários decaimentos decorrentes dessa partícula. Se os resultados continuarem sendo coerentes com o Modelo Padrão, será confirmado que ela é mesmo o bóson de Higgs.
Caso haja divergências, pode ser que explicações teóricas alternativas sejam adotadas. Já existe uma, chamada de supersimetria, que faz adendos ao Modelo Padrão e prevê a existência de vários bósons de Higgs com pequenas divergências entre si. Será que a existência de dois valores de energias diferentes obtidos pelo CMS e Atlas significaria a existência de dois bósons distintos?
Enquanto estas experiências não mostrarem resultados, é impossível afirmar qual dos modelos se adéqua melhor à natureza.
Fonte: CERN e G1