Uma equipe de astrofísicos está propondo uma teoria que muda radicalmente a forma como entendemos o Universo. O grupo afirma ter encontrado indícios de que as leis da física são diferentes em diferentes partes do Universo.
© Julian Berengut/UNSW (constante de estrutura fina)
O artigo propõe que uma das supostas constantes fundamentais da natureza talvez não seja assim tão constante.
Em vez disso, este "número mágico", conhecido como constante de estrutura fina, ou constante alfa, parece variar ao longo do Universo. A constante alfa mede a magnitude da força eletromagnética, ou seja, a intensidade das interações entre a luz e a matéria.
Há alguns anos, físicos propuseram que alfa poderia ter variado ao longo do tempo, numa escala de 12 bilhões de anos, mas agora os físicos propõem que ela varia ao longo do espaço.
Pelos dados obtidos pelos pesquisadores, a constante alfa não seria constante, mas variável, contrariando o princípio da equivalência de Einstein, que estabelece que as leis da física são as mesmas em qualquer lugar.
As implicações para o nosso entendimento atual da ciência são profundas. Se as leis da física passam a ser apenas localizadas, pode ser que, embora a nossa parte observável do Universo favorece a existência da vida e dos seres humanos, outras regiões mais distantes podem ter diferentes leis que se oponham à formação da vida, pelo menos tal como a conhecemos.
As conclusões dos pesquisadores foram baseadas em medições realizadas com o Very Large Telescope (VLT), no Chile, e com os maiores telescópios ópticos do mundo, no Observatório Keck, no Havaí.
"Os telescópios Keck e VLT estão em hemisférios diferentes, eles olham para direções diferentes ao longo do Universo. Quando olhamos para o norte com o Keck, vemos em média um alfa menor nas galáxias distantes, mas quando olhamos para o sul com o VLT, vemos um alfa maior. A variação observada é muito pequena, não mais do que 1 parte em 100.000. Mas é possível que variações muito maiores possam ocorrer fora do nosso horizonte observável", explica o Dr. Julian King, coautor do trabalho.
"Depois de medir a constante alfa em cerca de 300 galáxias distantes, surgiu uma consistência: este número mágico, que nos dá a força do eletromagnetismo, não é o mesmo em todos os lugares, como ele é aqui na Terra, e parece variar continuamente ao longo de um eixo preferencial através do universo," explica o professor John Webb, da Universidade de Nova Gales do Sul, na Austrália.
© John Webb/UNSW (eixo magnético universal)
Este talvez seja o elemento mais intrigante da proposta, o fato de a variação ter sido detectada como uma continuidade ao longo do espaço, o que daria uma espécie de "eixo preferencial" para o Universo; é como se houvesse um eixo magnético universal, atravessando todo o Universo observável, da mesma forma que há um eixo magnético de polo a polo da Terra.
De forma bastante interessante, esse eixo magnético universal coincide com medições anteriores que deram origem à teoria do chamado Fluxo Escuro, que indica que uma parte da matéria do nosso Universo estaria vazando por uma espécie de "ralo cósmico", sugada por alguma estrutura de um outro universo.
Se os dados se confirmarem, e não tiverem outra explicação menos revolucionária, um achado como esse poderia obrigar os cientistas a repensarem totalmente sua compreensão das leis da Natureza.
"A constante de estrutura fina, e outras constantes fundamentais, são absolutamente centrais para a nossa teoria atual da Física. Se elas realmente variam vamos precisar de uma teoria melhor, mais profunda," diz o Dr. Michael Murphy, coautor do trabalho.
A variação das leis da física, seja no espaço ou no tempo, sempre ocupou a mente dos cientistas. Pelas teorias atuais, uma pequena variação de alfa, por exemplo, significaria que as estrelas não produziriam carbono, a base da química que forma a vida na Terra.
É por isso que os cientistas afirmam que são as características "especiais" deste nosso ponto no Universo que criam as condições para a vida como a conhecemos, características estas que poderiam não existir em outros pontos.
"Embora uma 'constante variável' possa abalar a nossa compreensão do mundo que nos rodeia, afirmações extraordinárias exigem evidências extraordinárias. O que estamos descobrindo é extraordinário, não há dúvida sobre isso," diz Murphy.
Será que uma variação de 1 em 100.000 é assim tão extraordinária para corroborar esta hipótese teórica?
Fonte: Physical Review Letters (artigo submetido)