segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Estrela de nêutrons pode acordar o vácuo quântico

Embora o vazio espacial esteja repleto de campos quânticos, o efeito destes é geralmente muito sutil. Mas um grupo de físicos brasileiros demonstrou que, sob determinadas condições, como durante a formação de uma estrela de nêutrons, esses campos podem crescer a ponto de ofuscar qualquer matéria existente nas redondezas.
estrela de nêutrons
© NASA (estrela de nêutrons)
O espaço vazio é preenchido com uma espécie de fundo quântico fantasmagórico, formado por ondas de todas as frequências possíveis, incluindo não apenas as ondas do eletromagnetismo e das outras forças, mas também ondas representando partículas, como os elétrons.
A quantidade de energia nestas ondas é pequena, mas nunca é igual a zero, como uma corda, que sempre apresenta alguma vibração, nunca estando completamente parada e esticada.
William Lima e Daniel Vanzella, da USP de São Carlos, resolveram estudar como a gravidade afeta essa energia contida no vácuo quântico.
Como não existe uma teoria quântica completa da gravidade, eles usaram uma abordagem já bem aceita, chamada teoria quântica de campos em espaçotempos curvos (QFTCS).
Esta técnica utiliza a mecânica quântica padrão para descrever todos os campos, exceto a gravidade, e posteriormente inclui os efeitos gravitacionais de um modo diferente.
Segundo a relatividade geral, a força gravitacional surge quando o espaçotempo comum é curvado pela presença de massa e energia. Assim, a QFTCS usa esse espaçotempo relativista, em vez do espaço e tempo comuns, para os cálculos quânticos.
Os físicos brasileiros não analisaram todos os campos possíveis, apenas o tipo mais simples, chamado de campo escalar. Este campo é genérico, que poderia ser uma versão simplificada do campo eletromagnético ou poderia representar uma partícula ainda desconhecida.
Seguindo a prática padrão, eles deixaram sem especificação um parâmetro-chave deste campo: o parâmetro de "acoplamento", que quantifica a atração ou a repulsão do campo às regiões altamente curvadas do espaçotempo.
Os pesquisadores analisaram a energia do vácuo para um espaçotempo que começa com uma distribuição uniforme de massa no passado distante (espaçotempo plano) e depois evolui para concentrações fixas de massa (aglomerados) em um futuro distante.
A energia do vácuo resultante depende da massa e do tamanho dos aglomerados de matéria, e do parâmetro de acoplamento.
O resultado surpreendente foi que, para algumas combinações de valores, mesmo depois que a distribuição da massa pára de mudar, a energia do vácuo continua a crescer exponencialmente ao longo do tempo nas cercanias dos aglomerados.
Eventualmente, a densidade da energia do vácuo nessas regiões ultrapassa a densidade de energia da matéria ordinária, de forma que o vazio começa a distorcer o espaçotempo ainda mais do que a matéria é capaz.
Para ver se esse efeito importa na prática, Lima e Vanzella juntaram-se ao grupo de George Matsas, da UNESP (Universidade Estadual Paulista).
O resultado está neste artigo que acaba de ser publicado, que analisa um modelo de espaçotempo altamente curvado que emerge durante a formação de uma estrela de nêutrons ultra densa.
Para alguns valores razoáveis de massa e tamanho da estrela, eles preveem que, em alguns milissegundos, a energia do vácuo vai crescer para alguns valores do parâmetro de acoplamento.
Neste ponto, a energia do vácuo começa a induzir outros efeitos gravitacionais, que eles ainda não calcularam, de forma que ainda não sabem como a estrela seria afetada.
Se o prosseguimento da pesquisa mostrar que tal estrela de nêutrons fique instável, a existência de estrelas de nêutrons estáveis de tamanhos específicos pode descartar a existência dos campos do tipo modelado por eles ou confirmar sua existência. Ou seja, a teoria poderia ser testada pela observação e medição das massas de estrelas de nêutrons.
Vanzella adverte que o trabalho até agora não analisou como a crescente energia do vácuo modifica a curvatura do espaçotempo, nem quaisquer efeitos resultantes sobre a estrela de nêutrons.
"Até este momento eles não calcularam a solução numérica das equações de Einstein com a reação retornando sobre o campo, por isso ninguém sabe aonde isso vai dar," concorda Leonard Parker, da Universidade de Wisconsin, comentando o trabalho. "É um convite para mais investigação."
Fonte: Physical Review Letters

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