terça-feira, 22 de outubro de 2019

“Paradoxo dos gêmeos” em nível quântico

Um experimento recentemente proposto, que conecta um paradoxo concebido por Einstein à mecânica quântica, pode resultar em relógios e sensores mais precisos.

© M. Zych (relógio movendo-se em sobreposição de velocidades)

Magdalena Zych, física da Universidade de Queensland, na Austrália, e principal autora do estudo, conta que a colaboração internacional teve como objetivo testar o paradoxo dos gêmeos de Einstein usando partículas quânticas em estado de “sobreposição”.

O paradoxo dos gêmeos é uma das previsões mais contra-intuitivas da teoria da relatividade. O tempo pode passar em velocidades diferentes para pessoas em diferentes distâncias em relação a uma massa enorme, ou para pessoas viajando em velocidades distintas.

Por exemplo: se pegarmos um relógio de referência, distante de qualquer objeto massivo, um relógio mais próximo de uma massa ou um relógio se movendo em alta velocidade irá mostrar a passagem do tempo mais lentamente.

Isso cria um paradoxo dos gêmeos, em que um dos gêmeos vai para uma viagem em alta velocidade enquanto o outro fica para trás. Quando os gêmeos se encontrarem novamente, o gêmeo viajante será muito mais jovem, pois diferentes períodos de tempo se passaram para cada um deles.

É um efeito surpreendente, explorado em filmes populares como Interstellar, mas também foi verificado por experimentos do mundo real e é levado em consideração para que a tecnologia do GPS funcione.

A equipe incluiu pesquisadores da Universidade de Ulm e da Universidade de Hannover, na Alemanha, e descobriu como usar tecnologia a laser avançada para simular uma versão quântica do paradoxo dos gêmeos de Einstein.

Na versão quântica, em vez de gêmeos, haverá apenas uma partícula viajando em uma sobreposição quântica.

Uma sobreposição quântica significa que a partícula está em dois locais ao mesmo tempo, em cada um deles com uma probabilidade, mas ainda assim é diferente de colocar a partícula em um ou em outro local aleatoriamente. É outra maneira de um objeto existir, permitida apenas pelas leis da física quântica.

“A ideia é colocar uma partícula em sobreposição em duas trajetórias com velocidades diferentes, e verificar se uma quantidade de tempo diferente passa para cada uma delas, como no paradoxo dos gêmeos,” disse Zych.

“Se nosso entendimento da teoria quântica e da relatividade estiver correto, quando as trajetórias sobrepostas se encontrarem, o viajante quântico estará em sobreposição de ser mais velho e mais novo que ele próprio. Isso deixaria uma assinatura inconfundível nos resultados do experimento, e é isso que esperamos que seja encontrado quando o experimento for realizado no futuro.”

“Esse entendimento pode levar a tecnologias avançadas que permitirão aos físicos construir sensores e relógios mais precisos, que poderão, potencialmente, ser partes fundamentais de futuros sistemas de navegação, veículos autônomos e redes de alerta precoce de terremotos”.

O experimento por si só também responderá a algumas questões ainda em aberto da física moderna.
Um exemplo dessas questões é: o tempo pode exibir comportamento quântico ou é algo fundamentalmente clássico?

Esta questão é provavelmente crucial para o ‘Santo Graal’ da física teórica: ou seja, encontrar uma teoria conjunta que relacione os fenômenos quânticos e gravitacionais.

Um artigo foi publicado na revista Science Advances.

Fonte: Scientific American

terça-feira, 8 de outubro de 2019

Novas perspectivas sobre o Universo

Os cientistas James Peebles, Michel Mayor e Didier Queloz levaram o Prêmio Nobel de Física de 2019.
© Nobel Prize/Johan Jarnestad (explorando o cosmos)

O anúncio foi divulgado na manhã desta terça-feira pelo comitê da Academia Real de Ciências da Suécia, em Estocolmo. Na avaliação da instituição, o trabalho dos três físicos introduziu uma nova compreensão da história e estrutura do Universo através das teorias de cosmologia física desenvolvidas por Peebles e a descoberta de um exoplaneta por Mayor e Queloz.

O Prêmio Nobel de Física deste ano recompensa nova compreensão da estrutura do Universo e a primeira descoberta de um planeta em órbita n uma estrela do tipo solar fora do nosso Sistema Solar.
As ideias de James Peebles sobre cosmologia física enriqueceu todo o campo de pesquisa e lançou as bases para a transformação da cosmologia nos últimos cinquenta anos, da especulação à ciência. Seu referencial teórico, desenvolvido desde meados da década de 1960, é a base de estudos contemporâneos sobre o Universo.

O modelo do Big Bang descreve o Universo a partir dos primeiros momentos, quase 14 bilhões de anos atrás, quando estava extremamente quente e denso. Desde então, o Universo vem se expandindo, tornando-se maior e mais frio. Após 400.000 anos do Big Bang, o Universo se tornou transparente e os raios de luz foram capazes de viajar através espaço. Ainda hoje, essa radiação antiga está por toda parte, onde muitos dos segredos do Universo estão escondidos.

A cosmologia moderna é baseada na teoria da relatividade geral de Albert Einstein e assume uma era inicial, o Big Bang, quando o Universo era extremamente quente e denso. Um pouco menos de 400.000 anos após o Big Bang, a temperatura diminuiu para cerca de 3.000 K, permitindo que os elétrons se combinassem com núcleos para a formação de átomos.

Porque não sobraram partículas carregadas que pudessem interagir facilmente com os fótons, o Universo se tornou transparente à luz. Esta radiação é agora visível como a Cosmic Microwave Background  (CMB). Devido ao desvio para o vermelho cosmológico, sua temperatura atualmente é de penas 2,7K, um fator de cerca de 1.100 menores desde a dissociação de matéria e radiação. A radiação cósmica de fundo de micro-ondas consiste de ondas eletromagnéticas na frequência de rádio que permeiam todo o espaço.

Por intermédio de cálculos teóricos, James Peebles foi capaz de interpretar esses traços desde a infância do Universo e descubriu novos processos físicos.

Os resultados nos mostraram um Universo em que apenas 5% de seu conteúdo é conhecido, compondo a matéria ordinária que constituída por estrelas, planetas, árvores e nós. O restante, 95%, é desconhecido, perfazendo a matéria escura e energia escura. Isso é um mistério e um desafio à física moderna.

Em outubro de 1995, Michel Mayor e Didier Queloz anunciaram a primeira descoberta de um planeta fora do nosso sistema solar, um exoplaneta, orbitando uma estrela do tipo solar em nossa galáxia, a Via Láctea. No Observatório Haute-Provence, no sul da França, usando instrumentos feitos sob medida, eles foram capazes de ver o exoplaneta 51 Pegasi b, uma bola gasosa comparável com o maior gigante gasoso do Sistema Solar, o planeta Júpiter.

Esta descoberta iniciou uma revolução na astronomia e mais de 4.000 exoplanetas já foram encontrados na Via Láctea. Mundos novos e estranhos ainda estão sendo descobertos, com uma incrível variedade de tamanhos, formas e órbitas. Eles desafiam nossas ideias preconcebidas sobre sistemas planetários e estão forçando os cientistas a revisar suas teorias dos processos físicos por trás das origens dos planetas. Com vários projetos planejados para começar a procurar exoplanetas, podemos encontrar uma resposta para a eterna questão de saber se existe vida lá fora.

Os Laureados deste ano transformaram nossos pensamentos sobre o cosmos. Enquanto as descobertas teóricas de James Peebles contribuiu para a nossa compreensão de como o Universo evoluiu após o Big Bang, Michel Mayor e Didier Queloz explorou nossos bairros cósmicos em busca de planetas desconhecidos. Suas descobertas mudou para sempre nossas concepções do mundo.

James Peebles, professor da Universidade de Princeton, EUA, levará metade do prêmio de 9 milhões de coroas suecas, o equivalente a R$ 3,7 milhões. O restante será dividido entre Michel Mayor, docente da Universidade de Genebra, e Didier Queloz, que integra a mesma instituição, além da Universidade de Cambridge, no Reino Unido.

Fonte: The Royal Swedish Academy of Sciences

domingo, 25 de agosto de 2019

Imagem de um emaranhamento quântico

Pela primeira vez na história, pesquisadores conseguiram tirar uma foto de um tipo forte de emaranhamento quântico, chamado emaranhamento de Bell, revelando assim evidências visuais de um fenômeno misterioso que Albert Einstein, perplexo, chamava de “ação fantasmagórica à distância”.
© U. Glasgow (emaranhamento de Bell)

Duas partículas que interagem uma com a outra, como dois fótons passando por um divisor de feixes, podem, às vezes, continuar conectadas, e compartilhar instantaneamente seus estados físicos, a despeito da distância que as separa. Essa conexão é conhecida como emaranhamento quântico, e perpassa o campo da mecânica quântica.

Einstein achava que a mecânica quântica era “fantasmagórica” por causa da instantaneidade dessa aparente interação à distância entre duas partículas emaranhadas, um fenômeno que parecia incompatível com alguns conceitos de sua teoria da relatividade restrita.

Mais tarde, John Bell formalizou o conceito de interação não-local, descrevendo uma forma forte de emaranhamento que causa esse efeito fantasmagórico. Embora o emaranhamento de Bell esteja sendo usado em aplicações práticas, como computação e criptografia quânticas, ele nunca havia sido captado em uma única imagem até hoje.

Os físicos da Universidade de Glasgow, na Escócia, desenvolveram um sistema que dispara um fluxo de fótons emaranhados, a partir de uma fonte quântica de luz, sobre “objetos não convencionais” que são exibidos em materiais de cristal líquido, que alteram a fase dos fótons à medida que eles passam através desses materiais.

A equipe montou uma câmera muito sensível capaz de detectar fótons individuais, que só tiraria fotos quando detectasse tanto um fóton quanto seu “gêmeo” emaranhado, criando um registro visível do emaranhamento dos fótons.

“A imagem que conseguimos captar é uma demonstração elegante de uma propriedade fundamental da natureza, vista pela primeira vez na forma de uma imagem”, explica o autor principal do estudo, Paul-Antoine Moreau, da Faculdade de Física e Astronomia da Universidade de Glasgow. “É um resultado animador, que pode gerar avanços no emergente campo da computação quântica, e levar a novos tipos de imagiologia”.

O artigo, chamado “Imaging Bell-type nonlocal behavior”, foi publicado na Science Advances.

Fonte: Universidade de Glasgow

quarta-feira, 3 de julho de 2019

A criação de plasma de quarks e glúons

Uma ínfima fração de segundo após o Big Bang, o Universo material era constituído por um plasma composto pelas partículas elementares conhecidas como quarks e glúons. É o que propõe o chamado modelo padrão sobre a origem do Universo.
© CERN/LHC (colisão de prótons com núcleos atômicos de chumbo)

Com a rápida expansão e o consequente resfriamento, aquele meio informe e intensamente dinâmico se fragmentou e cada pequeno conjunto de quarks e glúons deu origem a uma partícula composta, o hádron. Assim foram formados, por exemplo, os prótons, cada qual constituído por dois quarks do tipo up e um quark do tipo down (os dois tipos com as menores massas entre todos os quarks), interagindo por meio de glúons.

Essa situação primordial tem sido reproduzida no LHC, o Grande Colisor de Hádrons instalado no CERN, a Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear, na fronteira entre a França e a Suíça, e também no RHIC, o Colisor Relativístico de Íons Pesados, instalado no Brookhaven National Laboratory, nos Estados Unidos.

As primeiras detecções do plasma de quarks e glúons foram feitas a partir da colisão de dois núcleos atômicos de elementos pesados, como chumbo e ouro. Agora, a colaboração ALICE, um dos grupos internacionais de pesquisadores que atua no LHC, obteve uma das “assinaturas” características do plasma de quarks e glúons por meio da colisão de prótons com núcleos de chumbo.

Esse resultado, conseguido a partir de precursores muito mais leves, foi alcançado graças ao altíssimo patamar de energia das partículas durante a colisão, de 5,02 TeV (5,02 teraelétrons-volt ou 5,02 x 1012 elétrons-volt).

O físico brasileiro Henrique Zanoli, que participa da colaboração ALICE, estudou essa colisão em seu trabalho de doutoramento.

“O experimento apresentou uma anisotropia azimutal na distribuição das partículas geradas pela colisão. Isso quer dizer que as partículas resultantes da colisão não foram produzidas nas mesmas quantidades em todas as direções. O padrão de distribuição dos elétrons que observamos é característico da assinatura do plasma de quarks e glúons,” disse Zanoli.

Segundo Zanoli, a produção de quarks pesados ocorreu em um momento em que a densidade de energia do sistema ainda estava extremamente alta, e sua evolução é uma interessante ferramenta para estudar a presença do plasma de quarks e glúons.

“Esses quarks pesados, que são produzidos antes do plasma e o atravessam, fornecem informações sobre o plasma, assim como uma emissão de pósitrons, que atravessa o corpo humano, fornece informações sobre esse corpo em uma tomografia. Se as partículas estudadas tivessem sido produzidas no fim do processo, essa analogia não seria válida e não poderíamos afirmar, com base no resultado final, quais são as características do plasma de quarks e glúons formado. Mas, como foram produzidos no início, os quarks pesados se tornam marcadores muito confiáveis,” acrescentou Zanoli.

O plasma de quarks e glúons é tema de muita pesquisa na atualidade. E isso principalmente por dois motivos. Primeiro, porque agora é possível produzir o plasma experimentalmente em colisores, como o LHC e o RHIC. Segundo, e essa é a maior motivação dos experimentos, porque possibilita compreender o Universo primordial e também o que ocorre em objetos astrofísicos, como as estrelas de nêutrons.

A produção do plasma de quarks e glúons em laboratório se tornou possível devido à altíssima densidade de energia alcançada nos grandes colisores da atualidade.

Um patamar de 5 TeV não é tão alto quando se pensa em um objeto macroscópico, constituído por uma quantidade enorme de partículas distribuídas em um grande volume. Mas, quando se divide 5 TeV pelo volume de um próton, o resultado é uma densidade energética a que somente agora a humanidade teve acesso em escala de laboratório.

Fonte: Physical Review Letters

terça-feira, 11 de junho de 2019

Salvando o gato de Schrödinger

O famoso paradoxo gato de Schrödinger foi elaborado como um símbolo da possibilidade de sobreposição de estados e da imprevisibilidade que são característicos do mundo quântico.
© Kat Stockton (gato de Schrödinger)

Uma equipe de pesquisadores diz ter descoberto um modo de capturar e salvar o famoso animal, antecipando seus saltos e agindo na hora exata para salvá-lo da tragédia. No processo, eles poderiam derrubar um dos mais antigos fundamentos da física quântica.

A descoberta, feita por um time de físicos da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, permite criar um sistema que avisa antecipadamente da iminência de um salto quântico em átomos artificiais contendo informação quântica.

O gato de Schrödinger é um famoso paradoxo usado para ilustrar o conceito de sobreposição, ou seja, a possibilidade de dois estados opostos existirem simultaneamente, e a imprevisibilidade na física quântica. A ideia é que um gato é colocado em uma caixa selada, com uma fonte radioativa e um veneno que será ativado se ocorrer o decaimento em algum átomo da substância radioativa.

A teoria da sobreposição da física quântica sugere que, até que alguém abra a caixa, o gato está ao mesmo tempo vivo e morto, numa espécie de sobreposição desses estados. O ato de abrir a caixa para observar o gato causaria uma mudança abrupta e aleatória em seu estado quântico, forçando-o a estar vivo ou morto.

Um salto quântico é a mudança aleatória e discreta (não-contínua) no estado que ocorre a partir do ato da observação.

O experimento, realizado no laboratório da Universidade de Yale pelo professor Michel Devoret e proposto pelo autor principal do artigo, Zlatko Minev, permite pela primeira vez espiar o mecanismo do salto quântico. Os resultados revelam uma descoberta surpreendente que contradiz a visão consagrada, estabelecida pelo físico dinamarquês Niels Bohr: a de que os saltos quânticos não são nem abruptos nem tão aleatórios como se pensava anteriormente.

Para um objeto tão pequeno como um elétron, uma molécula, ou um átomo artificial contendo informação quântica, chamada de “qubit”, um salto atômico é a transição repentina de um de seus estados de energia para outro. Nos computadores quânticos, ainda em desenvolvimento, pesquisadores precisam lidar com os saltos dos qubits, que são manifestações de erros de cálculos.
Os enigmáticos saltos quânticos foram teorizados por Bohr há mais de um século, mas não foram observados em átomos até os anos 1980.

“Esses saltos ocorrem todas as vezes que medimos um qubit”, explica Devoret. “Os saltos quânticos são conhecidos por serem imprevisíveis a longo prazo”. Apesar disso, adiciona Minev, “queríamos sabemos se seria possível conseguir um sinal de aviso prévio que um salto está prestes a ocorrer”. Minev conta que o experimento foi inspirado por uma previsão teórica de Howard Carmichael, da Universidade de Auckland, na Nova Zelândia, um pioneiro na trajetória da teoria quântica e um dos co-autores do estudo.

Além de seus impactos fundamentais, os resultados possivelmente trarão um avanço enorme no entendimento e no controle da informação quântica. Pesquisadores dizem que administrar com segurança a informação quântica e corrigir os erros quando eles ocorrem são os desafios principais no desenvolvimento de computadores quânticos totalmente eficientes.

A equipe de Yale usou uma abordagem especial para observar, indiretamente, um átomo artificial supercondutor, recorrendo a três geradores de microondas que irradiavam o átomo que estava aprisionado em uma cavidade tridimensional feita de alumínio.  O método de monitoramento duplamente indireto, que Minev criou para circuitos supercondutores, permite aos pesquisadores observarem o átomo com uma eficácia nunca antes vista.

A radiação em comprimento de micro-ondas agita o átomo artificial, enquanto ele é observado simultaneamente, o que resulta em saltos quânticos. O minúsculo indicativo quântico da ocorrência desses saltos pode ser amplificado sem perda de temperatura para a sala. Isso permite que o sinal seja monitorado em tempo real. Esse arranjo permitiu que os pesquisadores vissem uma repentina ausência de fótons de detecção (fótons emitidos por uma estado auxiliar do átomo quando agitado pelas micro-ondas); essa pequena queda nos fótons é o aviso prévio de que um salto quântico vai ocorrer.

“Esse belo efeito que o experimento revelou é o aumento da coerência durante o salto, apesar da observação”, diz Devoret. Minev adiciona: “Podemos usar isso não apenas para capturar o salto, mas também para revertê-lo.”

Esse é um ponto crucial, segundo os pesquisadores. Enquanto saltos quânticos aparecem pontualmente e aleatoriamente a longo prazo, reverter um salto quântico significa que a evolução do estado quântico possui, pelo menos em parte, um caráter determinista e não aleatório; o salto sempre ocorre da mesma maneira previsível a partir de seu início aleatório.

“Os saltos quânticos de um átomo são, de certa forma, análogos à erupção de um vulcão”, explica Minev. “Eles são completamente imprevisíveis a longo termo. Porém, com o monitoramento correto, podemos detectar o aviso prévio de um desastre iminente e agir sobre ele antes que ocorra.”

O estudo em questão foi publicado na revista Nature.

Fonte: Yale University

domingo, 2 de junho de 2019

Observação da radiação Hawking

Físicos do Instituto de Tecnologia de Israel (Technion) confirmaram as previsões de uma teoria de Stephen Hawking sobre buracos negros, utilizando um análogo construído em laboratório.


© Revista Física (ilustração de um buraco negro)

Ao tentar aplicar as leis físicas que regem o calor nos buracos negros, o físico Stephen Hawking percebeu que estes objetos devem emitir radiação de suas superfícies, chamada Radiação Hawking. O mecanismo concatena a mecânica quântica com a gravidade.

Stephen Hawking apresentou sua teoria em 1974, depois de analisar o trabalho de outro físico, Jacob Bekenstein, da Universidade de Princeton. Para Bekenstein, a entropia de um buraco negro, ou seja, o caos de um sistema relativo ao seu volume, pressão, temperatura e energia, era proporcional à área de seu horizonte de eventos, ponto-limite do qual não é mais possível escapar desta região do espaço.

A entropia de um buraco negro é dada pela equação de Bekenstein-Hawking: S=k.A/4.lP2 , onde A é a área, k é a constante de Boltzmann e lP é o comprimento de Planck que é expreso por lP=G.h/2π.c3)1/2  , sendo h a constante de Planck, G a constante gravitacional e c a velocidade da luz.

Infelizmente, ainda não é posível se aproximar o suficiente de um buraco negro para provar ou refutar a teoria. Assim, os físicos testaram um buraco negro análogo de laboratório.

Os pesquisadores construíram tal análogo de buraco negro usando um material quântico chamado de condensado de Bose-Einstein. Neste condensado de Bose-Einstein, o horizonte de eventos do buraco negro artificial representa o ponto sem retorno para o som, ao invés da luz.

Os cientistas criaram um condensado de Bose-Einstein capturando 8.000 átomos de rubídio em um feixe de laser. Os condensados ​​de Bose-Einstein são sistemas de átomos ultrafrios, onde estranhos fenômenos quânticos se tornam visíveis em escalas maiores.

Os pesquisadores em seguida utilizaram um segundo laser para aumentar a energia potencial de apenas um lado do condensado de Bose-Einstein, tornando-o mais denso naquele lado. Uma transição brusca (como um horizonte de eventos) separa a área mais densa (fora do buraco negro) da área menos densa (dentro do buraco negro).

Do ponto de vista dos cientistas, ao olhar para o experimento, parece que todos os átomos de rubídio estão se movendo. Fora do buraco negro, na região mais densa, a velocidade do som é mais rápida do que a velocidade deste fluxo, de modo que as ondas sonoras podem se mover em qualquer direção. Na região menos densa, dentro do buraco negro, a velocidade do som é mais lenta, então as ondas sonoras apenas se afastam da transição brusca e penetram no buraco negro.

Esta experiência imita uma das características mais importantes de um buraco negro: fora do objeto, a luz pode se afastar dele ou entrar nele. Mas, uma vez dentro, não pode escapar. O análogo de laboratório substitui a luz pelo som, e os pesquisadores podem medir as ondas sonoras dentro e fora de seu “horizonte de eventos”. O sinal da radiação Hawking é uma correlação entre estes dois tipos de ondas.

Isto foi suficiente para extrair informações importantes sobre a radiação, ou seja, que ela tem um espectro térmico com uma temperatura determinada pelo que seria o análogo da gravidade neste sistema artificial.

Isto significa que o buraco negro artificial emitiu um espectro contínuo de comprimentos de onda, em vez de comprimentos de onda preferidos. Estas observações e as temperaturas estavam de acordo com o que foi previsto na teoria de Hawking.

Segundo o principal autor do estudo, o físico Jeff Steinhauer, isso mostra que “os cálculos de Hawking estavam corretos”. Contudo, provavelmente são um efeito real que acontece nestes tipos de sistemas.

Esta pesquisa é mais um exemplo da utilização de análogos para estudarmos fenômenos físicos impossíveis de serem observados. Eles servem como uma verificação importante das teorias que orientam nossa compreensão de coisas inacessíveis.

Agora, os pesquisadores esperam refazer repetidamente o experimento, a fim de determinar como a radiação Hawking muda com o tempo.

Quem sabe um dia possamos medir essas propriedades em buracos negros reais.

Fonte: Nature

sábado, 23 de março de 2019

Será que ondas sonoras transportam massa?


É perdoável pensar que nossa compreensão da física clássica já tenha atingido seu máximo ao longo dos quatro séculos desde que Isaac Newton inventou suas leis de movimento. Mas novas pesquisas surpreendentes mostram que ainda há segredos esperando para serem encontrados, escondidos à vista de todos; ou, pelo menos neste caso, ao alcance da voz.
© Shustterstock (ilustração de ondas sonoras)

Um grupo de cientistas teorizou que as ondas sonoras possuem massa, o que significa que os sons seriam diretamente afetados pela gravidade. Eles sugerem que os fônons, excitações coletivas parecidas com partículas, responsáveis pelo transporte de ondas sonoras através de um meio, podem exibir uma pequena quantidade de massa em um campo gravitacional. "Seria de se esperar que resultados de física clássica como esse já fossem conhecidos há muito tempo," diz Angelo Esposito, da Universidade de Columbia, principal autor do estudo.

Esposito e seus colegas se basearam em um artigo anterior, publicado no ano passado, no qual Alberto Nicolis, da Columbia, e Riccardo Penco, da Universidade Carnegie Mellon, sugeriram pela primeira vez que os fônons poderiam ter massa em um superfluido. O estudo mais recente, no entanto, mostra que este efeito também deve ser válido em outros materiais, incluindo líquidos e sólidos regulares, e até mesmo no próprio ar.

E, embora se espere que a quantidade de massa transportada pelos fônons seja pequena, comparável a um átomo de hidrogênio, cerca de 10-24gramas, ela pode, na verdade, ser mensurável. Exceto que, se você fosse medí-la, encontraria algo profundamente estranho: a massa dos fônons seria negativa, significando que eles cairiam "para cima". Com o tempo, sua trajetória gradualmente se afastaria de uma fonte gravitacional como a Terra. "Se tivessem massa gravitacional positiva, eles cairiam para baixo," diz Penco.

E a extensão da "queda" é igualmente pequena, com a variação dependendo do meio pelo qual o fônon está passando. Na água, onde o som se move a 1,5 quilômetros por segundo, a massa negativa do fônon faz com que se desloque a cerca de 1 grau por segundo. Mas isso corresponde a uma mudança de 1 grau ao longo de 15 quilômetros, o que seria extremamente difícil de medir.

Ainda que possa ser difícil, tal medida ainda deve ser possível. Esposito observa que, para distinguir a massa dos fônons, é possível procurá-los em um meio onde a velocidade do som seja muito lenta. Isso pode ser possível no hélio superfluido, onde a velocidade do som pode cair para centenas de metros por segundo ou menos, e a passagem de um único fônon pode mudar o equivalente a um átomo de material.

Alternativamente, em vez de buscar efeitos minúsculos ampliados em substâncias exóticas, os pesquisadores podem procurar por sinais mais óbvios de fônons portadores de massa estudando de perto ondas sonoras extremamente intensas. Os terremotos oferecem uma possibilidade, diz Esposito. De acordo com seus cálculos, um tremor de magnitude 9 liberaria energia suficiente para que a mudança resultante na aceleração gravitacional da onda sonora do terremoto pudesse ser mensurável usando relógios atômicos. (Embora as técnicas atuais não sejam suficientemente sensíveis para detectar o campo gravitacional de uma onda sísmica, futuros avanços na tecnologia podem tornar isso possível.)

É improvável que as ondas sonoras que têm massa tenham um grande impacto na vida cotidiana, mas a possibilidade que algo tão fundamental tenha passado despercebida por tanto tempo é intrigante.

Um artigo foi publicado no periódico Physical Review Letters.

Fonte: Scientific American

Levitação de objetos macroscópicos com luz


Pesquisadores da Caltech (Instituto de Tecnologia da Califórnia) estão desenvolvendo uma maneira de fazer levitar e impulsionar objetos usando apenas a luz, através da criação de determinados padrões, em nanoescala, na superfície dos objetos.


© H. Atwater (ilustração de objeto nano-modelado reorientado)

Embora ainda esteja na etapa teórica, o trabalho é um passo em direção ao desenvolvimento de uma espaçonave que poderia alcançar o planeta mais próximo fora do nosso Sistema Solar em 20 anos, alimentada e acelerada apenas pela luz.

A pesquisa foi feita no laboratório de Harry Atwater, Howard Hughes Professor de Física Aplicada e Ciência de Materiais na Divisão de Engenharia e Ciências Aplicadas da Caltech.

Décadas atrás, o desenvolvimento das chamadas “pinças ópticas” permitiu que os cientistas movessem e manipulassem objetos minúsculos, como nanopartículas, usando a pressão radiativa de um feixe de luz do laser nitidamente focado. Este trabalho formou a base para o Prêmio Nobel de Física de 2018. No entanto, as pinças só são capazes de manipular objetos muito pequenos e apenas a distâncias muito curtas.

Ognjen Ilic, pós-doutorando e autor do estudo, oferece uma analogia: "Pode-se levitar uma bola de pingue-pongue usando um fluxo constante de ar de um secador de cabelo. Mas não funcionaria se a bola de pingue-pongue fosse muito grande ou se estivesse muito longe do secador de cabelo, e assim por diante".

Com essa nova pesquisa, objetos de diversas formas e tamanhos, de micrômetros a metros, poderiam ser manipulados com um feixe de luz. A chave é criar padrões específicos em nanoescala na superfície de um objeto. Esse padrão interage com a luz de tal forma que o objeto pode se endireitar quando perturbado, criando um torque de restauração para mantê-lo no feixe de luz. Assim, em vez de exigir raios laser altamente focalizados, o padrão dos objetos é projetado para "codificar" sua própria estabilidade. A fonte de luz também pode estar a milhões de quilômetros de distância.

"Nós criamos um método que pode levitar objetos macroscópicos", diz Atwater, que também é diretor do Centro Conjunto de Fotossíntese Artificial. "Há uma aplicação audaciosa e interessante para usar essa técnica como meio de propulsão de uma nova geração de naves espaciais. Estamos longe de realmente fazer isso, mas estamos no processo de testar os princípios."

Em teoria, essa espaçonave poderia ser modelada com estruturas em nanoescala e acelerada por uma luz laser baseada na Terra. Sem precisar carregar combustível, a espaçonave pode alcançar velocidades muito altas, até relativísticas, e possivelmente viajar para outras estrelas.

Atwater também prevê que a tecnologia poderia ser usada aqui na Terra para permitir a rápida fabricação de objetos cada vez menores, como placas de circuito.

Um artigo descrevendo a pesquisa aparece na edição on-line da revista Nature Photonics.

Fonte: Caltech